A Universidade Federal do Ceará (UFC) está entre as instituições públicas de ensino superior sob intervenção do governo Bolsonaro e que vivenciam a escassez de financiamento. A ADUFC-Sindicato percorreu, ao longo desta semana, diferentes unidades acadêmicas da UFC, em Fortaleza, e conversou com professores e servidores técnico-administrativos sobre problemas estruturais da UFC. O sindicato visitou canteiros de obras abandonadas, prédio histórico com risco de desabamento e blocos didáticos desativados, e inicia hoje (20) uma série de reportagens para denunciar o sucateamento da universidade.
Ciente de que a UFC vivencia uma gestão intransigente e com histórico de perseguição à comunidade universitária, a ADUFC preservará os nomes dos docentes que contribuíram com esta reportagem. O interventor tenta há meses emplacar o discurso vazio de que a ADUFC é contra o retorno das aulas presenciais após dois anos de pandemia. Também insiste para que o sindicato revele as identidades dos professores denunciantes na tentativa de repetir práticas largamente adotadas por sua administração, como o rebaixamento de notas de avaliação docente ou ameaças de processos administrativos e criminais.
A postura raivosa da gestão superior busca minimizar e esconder o abandono da universidade e a falta de recursos. A narrativa apresentada pelo interventor em seus ataques disfarçados de “comunicados” não condizem com a realidade de quem vivencia a UFC. Cândido Albuquerque assegurou, no último dia 13 de maio, que inúmeras obras paralisadas foram “replanejadas, retomadas, melhoradas e entregues para o uso e benefício de toda a comunidade acadêmica”. Uma rápida visita aos campi revela o abismo entre os releases divulgados pela Reitoria e a real situação da universidade.
Falta de pinturas nos prédios, reboco decadente nas paredes e outras demandas desta natureza amplamente relatadas por docentes tornam-se até menos graves diante de problemas, inclusive sanitários, encontrados pela ADUFC em visitas aos departamentos. Até pestes de roedores e cupins são dificuldades que docentes encaram diariamente, como o que ocorre no Departamento de Engenharia Mecânica, onde o sindicato flagrou ratoeiras. Portas das salas também chegaram a cair, sendo inutilizadas por infestação de cupim.
No Centro de Tecnologia também há reclamações de falta de computadores adequados para o trabalho dos professores e de aparelhos de ar condicionado e projetores quebrados, conforme já foi informado pela ADUFC à reitoria. “O computador da minha sala, no qual trabalhava antes da pandemia, está completamente ultrapassado. O acesso à internet é muito lento. Além disso, não consigo sequer fazer atividades apenas de texto, por exemplo. Relatei à chefia, a qual tentou uma uma solução junto à diretoria, que, por falta de recursos, tentou resolver recorrendo a equipamentos usados, mas não conseguiu”, diz um dos docentes.
É escandalosa a condição do prédio do Instituto de Cultura e Arte (ICA), no Campus do Pici, que deveria sediar os cursos de Cinema e Audiovisual, Dança, Design – Moda, Filosofia, Gastronomia, Jornalismo, Música, Publicidade e Propaganda e Teatro. As aulas de Jornalismo, entretanto, continuam no Centro de Humanidades II. Isso porque o prédio que abrigaria o curso nunca foi concluído e não há qualquer perspectiva de que a obra seja retomada. As construções foram isoladas, por meio de uma parede, e hoje o local tornou-se um risco à comunidade universitária.
Técnico-administrativos relataram à ADUFC que o espaço passou a ser utilizado por pessoas de fora da universidade. Acrescentaram que, pela ausência de ocupação no local, já ocorreram roubos no prédio do ICA a partir da construção abandonada, o que tem gerado um clima de insegurança. Há, ainda, relatos de fumaça invadindo as salas de aula e os departamentos, causada por fogueiras acesas no prédio desativado.
Também está em situação precária um dos blocos do curso de Gastronomia, que deveria abrigar quatro laboratórios: o de sensorial, o de demonstração (que também funcionaria como auditório), o de análise de alimentos e o de controle sanitário. Estas salas, localizadas em um corredor sem qualquer luminosidade, nunca foram equipadas. Todo o bloco está sem energia elétrica.
Para assistir às aulas que deveriam ser ministradas nestes laboratórios, estudantes de Gastronomia precisam recorrer ao Departamento de Engenharia de Alimentos e à Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). Mesmo com a cooperação, a infraestrutura dos dois espaços não contempla, integralmente, as demandas do curso de Gastronomia, que requer equipamentos específicos para que a grade curricular seja cumprida adequadamente. “As aulas acabam ficando limitadas”, relata uma funcionária.
Outra situação grave é a da Torrinha, como é chamado o prédio histórico que abrigou por décadas os centros e diretórios acadêmicos dos cursos de Psicologia e Comunicação Social. O local, situado no Centro de Humanidades II, está desativado por risco de desabamento, com o telhado completamente comprometido e sem condições sanitárias de acesso. “Está fechada e em condição horrível, tornou-se um local totalmente perigoso”, aponta uma professora do curso de Jornalismo. Como o prédio teve de ser desocupado por oferecer risco de habitação, os estudantes dos DA e CA de Jornalismo e Psicologia foram acomodados em salas improvisadas nos respectivos cursos.
Nem mesmo água e café são disponibilizados nos departamentos, contrariando a declaração do interventor no dia 13/5. “Não temos nem água nem café, apesar de o reitor dizer que garante água e café para todos os cursos da UFC. Aqui, os professores fazem uma vaquinha para comprar”, diz docente do curso de Jornalismo. Até a cafeteira utilizada é de um dos professores, que comprou com recursos próprios e levou para a universidade. O relato é o mesmo nas outras unidades acadêmicas.
Apesar dos ataques incessantes às liberdades na universidade, a ADUFC seguirá cumprindo o seu papel de defender a categoria docente e lutar por uma universidade pública, gratuita e democrática. Continuaremos denunciando à sociedade a realidade que não é retratada no site da UFC. O mais recente episódio de censura culminou no afastamento do Prof. Nonato Lima da direção da Rádio Universitária FM. É esse o modus operandi da gestão superior para tentar calar as (muitas) vozes que ecoam pela universidade, mas insistiremos na ação coletiva para enfrentar esses tempos sombrios na universidade que hão de passar.