As intervenções de Jair Bolsonaro nas reitorias das universidades federais e as consequências desse processo na autonomia e na democracia universitárias continuam mantendo entidades representativas em estado de alerta permanente. Nesta segunda-feira (5/10) o tema foi discutido na 45ª edição do programa Viração, da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas (ADUFPel). Desta vez, com a participação do presidente da ADUFC-Sindicato, Prof. Bruno Rocha, e da Profª Rúbia Vogt, presidente da sessão sindical do ANDES na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
O viés antidemocrático do projeto do interventor Cândido Albuquerque para a Universidade Federal do Ceará (UFC), e que o fez ser rejeitado desde sua candidatura, foi relembrado durante o programa. À época do processo de escolha do novo comando da instituição, Cândido recebeu apenas 610 votos, ficando em terceiro lugar na consulta pública. O presidente da ADUFC enfatizou o que as instituições federais de ensino superior brasileiras vêm sentindo desde que Jair Bolsonaro tomou posse como presidente: “Há uma organização bem orquestrada entre o Ministério da Educação e o governo Bolsonaro, de indicar os menos votados como os candidatos bolsonaristas”.
A lógica do programa Future-se foi um dos pontos de discussão no programa, em que o presidente da ADUFC também relembrou que os interventores de Bolsonaro já traziam em suas propostas a lógica do plano, que “busca transformar as universidades e outras instituições públicas de ensino em instituições a serviço de corporações privadas” e do lucro. No caso da UFC, foi apontado o empenho do interventor, nesse primeiro ano de gestão, em destruir a gestão democrática da universidade – fato que ficou novamente evidenciado mais recentemente nas perseguições que Cândido tem promovido contra os professores da Faculdade de Direito da instituição.
Bruno Rocha alertou para a busca da mercantilização do ensino superior promovida pelo governo Bolsonaro. O estabelecimento de organizações sociais como forma de conduzir o patrimônio da universidade foi um dos exemplos. “Por isso a rejeição do Future-se foi extremamente importante para proteger a universidade. No entanto, graças a essa negação da comunidade acadêmica ao projeto, a intervenção foi necessária: para que o plano fosse instaurado por dentro. Isso se faz notório em ações como o cancelamento de bolsas e credenciamento de fundações de apoio nas universidades sem que um projeto seja apresentado informando o que essa fundação fará na universidade”, analisou o professor.
UFRGS: 14º resultado de eleição ignorado por Bolsonaro
Desde o início de sua gestão, em pelo menos 14 oportunidades o presidente da República decidiu nomear um reitor ou diretor de instituições federais de ensino que não encabeçava uma lista tríplice ou, pior, sequer constava entre os nomes indicados a partir das consultas internas. A Profª. Rúbia Vogt relatou o caso mais recente, que ocorreu na UFRGS, onde docentes e estudantes têm liderado uma campanha para que Jair Bolsonaro respeite a consulta interna daquela universidade federal.
O atual momento pandêmico, no entanto, vem dificultando o movimento de resistência na instituição gaúcha. Segundo Rúbia Vogt, todas as mobilizações contra as intervenções são válidas, sejam elas online e em atos de rua. “Embora esses quadros de intervenção tenham particularidades locais e regionais, é necessária uma articulação nacional para pensarmos espaços de luta”, enfatizou a docente.
Na UFC, tão logo o interventor fora nomeado, em agosto do ano passado, estudantes e professores uniram-se em um ato coletivo fechando um dos principais cruzamentos de Fortaleza – Av. da Universidade com Av. 13 de Maio, onde se localiza a reitoria. Em poucos dias, já havia sido criado um Comitê em Defesa da Autonomia Universitária, formado por estudantes e servidores docentes e técnicos-administrativos da UFC, que também montaram uma tenda nos jardins da Reitoria, fincando o movimento de resistência. As manifestações seguiram-se por meses.
(*) O áudio do programa Viração sobre as intervenções nas universidades federais pode ser acessado diretamente no site da ADUFPel. O programa também está disponível nas plataformas de streaming de áudio, como Spotify e .