Uma série de dúvidas tem movimentado servidores docentes e técnico-administrativos das Instituições Federais de Ensino Superior (Ifes) desde o último dia 28 de agosto, quando o Governo Federal publicou o Decreto n° 9.991. A norma trata da Política Nacional de Desenvolvimento de Pessoas (PNDP) e interfere em dispositivos do Regime Jurídico Único (RJU), relacionados a licenças e afastamentos para capacitação. Em parecer emitido através de sua assessoria jurídica, a ADUFC analisou a constitucionalidade e a legalidade do ato normativo. Caso ele seja aplicado às Ifes em sua literalidade, pode ser entendido como violação da autonomia universitária. Docentes que tiverem dúvidas ou já estiverem enfrentando problemas em virtude da aplicação do Decreto 9.991/2019 podem acionar a assessoria jurídica do sindicato.
Pelo decreto, novas regras e procedimentos estão previstos ao servidor que se afastar para ações de desenvolvimento. Um exemplo é o licenciamento por período superior a 30 dias consecutivos – o decreto determina que o servidor deverá requerer sua exoneração ou dispensa do cargo em comissão ou função de confiança ocupado, e que não terá direito às gratificações e adicionais que não façam parte da estrutura remuneratória básica do cargo. Inúmeras outras mudanças estão detalhadas no ato normativo de agosto, muitas delas, no entanto, em confronto com a Lei 8.112/90.
A pretexto de regulamentar o RJU, o Decreto parece querer afastar dispositivos específicos da carreira do magistério superior, previstas na Lei 12.272/2012, vinculando assim a política de desenvolvimento de pessoal ao Ministério da Economia e criando uma ingerência no Ministério da Educação (MEC). É o que explica um dos integrantes da assessoria jurídica da ADUFC, Thiago Câmara Loureiro. De acordo com ele, a norma fere a autonomia universitária.
Além de ferir essa autonomia, o ato normativo traz conflitos com a legislação vigente, abrindo amparo legal para requerer que o decreto não tenha validade para os servidores das universidades federais. O parecer emitido em 30 de setembro pela assessoria jurídica da ADUFC é semelhante a outros que já vêm sendo divulgados não só por entidades sindicais, mas até pela Advocacia Geral da União.
UFC e UnB: decreto não se aplica
A própria Universidade Federal do Ceará (UFC) argumenta que o Decreto 9.991 “não é aplicável” nem aos cargos do magistério federal nem aos técnico-administrativos que compõem as universidades. O parecer foi emitido no último dia 3 de outubro pelo procurador geral da UFC, Paulo Antônio de Menezes Albuquerque. Antes, em setembro, a Procuradoria Geral da União junto à Fundação Universidade de Brasília (UnB) também emitira parecer semelhante, assinado pelo procurador geral e coordenador de Assuntos Prioritários e Estratégicos daquela instituição, Vitor Pinto Chaves.
“Essas manifestações são importantes porque são as próprias procuradorias das universidades dizendo que esse decreto não se aplica a elas. É uma orientação jurídica que deve ser considerada”, destaca o advogado Thiago Câmara. Segundo ele, já há leis que regulamentam os assuntos tratados no novo decreto.
Análise prévia
Após a entrada em vigor do decreto analisado, diversas Ifes estão se movimentando para buscar cumprir as novas disposições. O parecer emitido pela ADUFC é uma análise prévia e pretende analisar de maneira não exaustiva a constitucionalidade e a legalidade do decreto, buscando esclarecer algumas questões relacionadas a situações jurídicas em curso ou consolidadas.
Ainda segundo o parecer, o decreto n° 9.991/2019 pode ser considerado como uma interferência na autonomia das Ifes, na medida em que busca restringir a capacidade de autogestão das universidades e institutos federais. Ao procurar concentrar a política de aperfeiçoamento de pessoal em órgão do Ministério da Economia, o decreto esvazia instâncias de deliberação interna das Ifes e as sujeita a uma agenda geral de aperfeiçoamento de pessoal. “É mais adequado que a política de aperfeiçoamento de pessoal seja feita e executada pelas próprias Ifes e não por órgão centralizador, ligado ao Ministério da Economia”, diz o documento.
Quanto à aplicação do novo decreto no tempo, a assessoria jurídica da ADUFC também concluiu que ele não pode ser utilizado para alterar a situação jurídica de afastamentos já deferidos ou em curso. “Os requerimentos de afastamento para aperfeiçoamento pessoal que foram feitos antes do dia 6 de setembro de 2019 devem ser processados e julgados de acordo com o direito em vigor à época”, afirma o parecer.
A assessoria jurídica do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (ANDES-SN) elaborou uma nota técnica, na qual avalia preliminarmente pontos do decreto e também considera que o texto “pode ter extrapolado sua função regulamentar, sendo portanto passível de ser declarado ilegal”. A análise completa da assessoria jurídica do ANDES-SN está disponível neste link.
O parecer da assessoria jurídica da ADUFC pode ser acessado neste link.