Ultimamente tem crescido entre alguns economistas e técnicos, sobretudo do governo, o debate acerca da possibilidade do Brasil aderir ao processo de securitização da Dívida Ativa da União.
Mas, antes de avançarmos na nossa reflexão, vamos inicialmente situá-los sobre o que seria a “securitização”. Num conceito simplificado, a securitização constitui-se na conversão de uma dívida em título lastreável e negociável entre instituições financeiras.
Quem defende esta operação afirma que é um “bom negócio” aderir a securitização porque a operação “transfere o risco aos investidores”, além de transformar um “papel ruim em papel bom”, na linguagem do mercado.
Recentemente o ministro da Fazenda, Henrique Meireles, em entrevista a uma revista de circulação nacional afirmou que o Brasil está estudando a possibilidade de securitizar a Dívida Ativa da União. A Dívida Ativa vem a ser o resultado de créditos tributários não pagos ao Estado, como multas de trânsito, ambientais, de defesa do consumidor etc.
Para exemplificar: se um cidadão possui um valor devido de Imposto de Renda e não paga, torna-se inadimplente e aquele valor é inscrito na conta da Dívida Ativa da União. Assim também ocorre com impostos municipais e estaduais.
A justificativa de Meireles para lançar mão do artifício da securitização seria para ajudar no “esforço fiscal de R$ 55,4 bilhões que precisaria ser feito para cumprir a meta fiscal do ano que vem, que prevê um déficit de R$ 139 bilhões”. Aparentemente a decisão do ministro da Fazenda sugere apontar para uma boa alternativa, porém, não passa de uma armadilha.
Na verdade, essa operação de securitização da Dívida Ativa pretende vender recebíveis do governo a “preço de banana”, com um “deságio” que pode chegar a 70% do valor. O mais grave é que, para o governo efetivar esse tipo de operação, será necessário a criação de uma empresa pública, gerenciada pelo Poder Público, com os custos inerentes da implantação de uma instituição deste tipo, com a finalidade de emitir títulos (debentures) para poder negociar com o mercado financeiro.
Também há o agravante jurídico. Especialistas defendem que esse tipo de operação é inconstitucional. Segundo a Constituição Federal a cobrança da Dívida Ativa é de competência exclusiva da Advocacia Pública, que terá que manter o aparato à disposição do mercado para cobrar os títulos não pagos. Há também aqueles que defendem que esse tipo de operação fere a Lei de Responsabilidade Fiscal, em razão do Estado estar impossibilitado de “alienar” créditos tributários, por promover antecipação de receita.
Fica claro então que é um “excelente negócio” para o mercado enquanto que o Estado brasileiro poderá cair nessa “armadilha” e arcar apenas com o ônus das operações. Os recebíveis tributários aos quais o governo é detentor poderão ser negociados pela metade do preço ou, muitas vezes, por um terço do valor, o que poderá representar um prejuízo grande aos cofres públicos, já que, no futuro, esses papéis poderiam ser fonte de recursos para a administração pública. Definitivamente não é a solução para aumentar a receita e diminuir o rombo no orçamento. Que tal começar por uma reforma tributária que taxe as grandes fortunas ou uma auditoria da Dívida Pública que detecte onde estão os vazamentos dos recursos públicos que atualmente faltam para as áreas prioritárias, como saúde, educação, segurança pública e educação? Fica a reflexão.