A reunião ocorreu na última quinta (14), na ADUFC, e contou com participação virtual de docentes do interior
O Conselho de Representantes da ADUFC aprovou, por unanimidade, na noite da última quinta-feira (14), o indicativo de greve da categoria, a ser votado em Assembleia Geral na próxima quarta-feira (20). Docentes de diferentes unidades acadêmicas partilharam relatos sobre insatisfações de colegas a respeito da perspectiva de reajuste salarial zero em 2024, conforme sinalizado pelo governo federal, e o clima nos departamentos para a construção de uma possível greve unificada da Educação. A pauta vem à tona seguindo as deliberações do 42º Congresso do ANDES-SN, que decidiu, em 28 de fevereiro, pela construção de uma greve do Sindicato Nacional diante da frustração com mais uma rodada de negociação com o Palácio do Planalto, sem sucesso, ocorrida no dia anterior.
Entre as sugestões encaminhadas para a Assembleia Geral, estão a produção de uma campanha de comunicação em defesa do serviço público e das universidades que dialogue com a sociedade; a construção conjunta de mobilização com os técnicos administrativos (TAEs) e estudantes, além da aprovação do calendário para votação da greve, tais como assembleias e plebiscito. Nesta semana, a ADUFC promoveu plenárias na capital e no interior para debater o tema com os/as sindicalizados/as e oficializou apoio à greve dos/as TAEs das universidades federais cearenses.
A presidenta da ADUFC, Profª. Irenísia Oliveira, avaliou que a reação da categoria docente tem sido majoritariamente de reconhecer os esforços contínuos da mobilização nacional pela campanha salarial e de indignação com a falta de respostas do governo federal. “As pessoas estão percebendo que houve um esforço da campanha salarial, nos colocamos para negociar, houve as plenárias do Fonasefe, ações aqui (no Ceará) e em Brasília, mas que nesse momento a negociação está travada nesse zero por cento que ninguém está aceitando”, destacou. “Como Diretoria, nós avaliamos que a greve é oportuna e estratégica nesse momento”, defendeu.
Paralisação tem aspectos formativos e educativos
O Prof. Babi Fonteles (FACED/UFC) citou os aspectos educativos e formativos da construção da greve no sentido de ser um momento de defesa da universidade pública e de firmar um posicionamento político sobre as prioridades do Orçamento federal. “A greve é um caminho que precisamos lançar mão para pautar as políticas públicas, a LDO, o orçamento, o fortalecimento do ensino superior (…) Devemos ocupar os espaços de debate e fazer uma campanha forte em defesa do serviço público, das universidades”, ressaltou. “Estamos no segundo ano de governo, o timing é agora. Por ser um ano eleitoral, as questões tendem a reverberar com mais força e sensibilidade”, acrescentou.
Docente do Centro de Ciências Agrárias e da Biodiversidade da UFCA, a Profª. Priscila Teixeira concordou com o aspecto formativo da greve e lembrou a importância de construir a mobilização junto com o movimento estudantil. “Quando a gente vai para a rua em um governo que a gente lutou tanto para colocar lá, mostra que a nossa defesa é a luta pela educação, em defesa da categoria docente”, opinou, avaliando que o clima entre os/as docentes em relação à greve começou a mudar nas últimas semanas. “Conversando com os colegas, todo mundo tomou um susto inicialmente, mas hoje a sensação é de que é necessário mesmo haver a greve”, aponta.
Diretora de Relações Intersindicais da ADUFC, a Profª. Sônia Pereira fez um apelo para que as pautas relativas aos/às servidores/as aposentados/as sejam lembradas no plano de lutas. Isso porque a proposta mais recente do governo federal privilegia servidores/as da ativa, como o reajuste no Auxílio Alimentação. “Quando a gente se aposenta, perde o programa do abono permanência, o salário cai, perde o Auxílio Alimentação. E é isso que o governo está propondo na mesa de negociação: oferece benefícios que não contemplam aposentados”, disse. “Quem sabe a gente começa a colocar uma semente para debater a reforma da previdência, que precisa ser revertida”, completou.
Narrativa sobre greve no governo Lula deve ser enfrentada
Outra questão que precisa ser enfrentada, na opinião dos/as docentes, é o argumento recorrente de que servidores/as públicos/as federais não entraram em greve na gestão ultradireita de Jair Bolsonaro, mas agora o fazem em um governo democrático. “A gente vai encontrar colegas que vão dizer: mas agora que estamos no governo Lula faremos greve? E é exatamente isso. É o momento de a gente fazer, porque é um governo que se propõe ao diálogo”, reforçou Sônia Pereira. Docentes reforçaram a construção do discurso de que a mobilização não é contra o governo Lula especificamente, mas, justamente por ser uma gestão progressista, espera-se um diálogo real com a classe trabalhadora.
Também partilha dessa visão o Prof. Bruno Rocha, do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFC, que resgatou a greve sanitária que o movimento docente tentou aprovar na era bolsonarista em decorrência da pandemia, ainda em 2020, mas a decisão da categoria, soberana, foi de não paralisar naquele momento. “O medo se impôs. Tivemos ameaças de salários com a PEC 32, mas persistimos na mobilização. Mas não tinha a concretude de condições objetivas para a greve, de mobilização”, explica. “Esse é o momento de a gente conseguir uma negociação favorável. Nós ouvimos durante a posse do Lula que nós deveríamos pressionar e provocar o governo”, lembrou.
Para o Prof. Uribam Xavier, do Departamento de Ciências Sociais da UFC, há uma luta política e econômica a ser encarada, ponderando a dificuldade de mobilização atual das categorias até mesmo quando se “mexe no bolso”. “A outra questão que passa pelos dois vieses é a disputa do orçamento, que temos que fazer com o setor financeiro. Os gastos com a dívida pública, por exemplo, nem sequer são questionados. E sobre como o governo está cedendo nas isenções fiscais, esse dinheiro pertence ao conjunto da população”.
Ainda na avaliação de Uribam, a Mesa Nacional de Negociação Permanente adotou uma estratégia de “mobilizar para desmobilizar” após meses de negociações sem resultados concretos. Bruno Rocha também avaliou a atuação da mesa como um “simulacro”. “É um simulacro porque não há margem de negociação. O governo formou um Ministério da Gestão, mas indica pessoas para a mesa que não têm autonomia para negociar”, criticou.
No dia 22 de março, o ANDES-SN fará uma reunião do Setor das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), da qual a ADUFC participará, para debater os resultados das assembleias gerais das seções sindicais nos estados. No encontro, o Sindicato Nacional aprovará os encaminhamentos sobre a greve do setor da Educação.