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HELENA NADER NO CEARÁ – “Quem fala mal da ciência brasileira não conhece nossa história”, diz presidente da Academia Brasileira de Ciências

Conferência da Profª Helena Nader ocorreu no Auditório do Centro de Ciências da UFC, a convite da ADUFC
(Fotos: Nah Jereissati/ADUFC-Sindicato)

Presidente da Academia Brasileira de Ciências (ABC), a biomédica e professora Helena Nader esteve em Fortaleza na última segunda-feira (12/9) para ministrar a conferência “Educação e Ciência: pilares para soberania e independência de uma nação“. A atividade, realizada no auditório do Centro de Ciências da Universidade Federal do Ceará (UFC), no campus do Pici, foi uma iniciativa do Grupo de Trabalho (GT) Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente da ADUFC-Sindicato. O evento também teve transmissão em tempo real, com interpretação em Libras, pelo canal da entidade no YouTube.

Entre os temas discutidos pela cientista, estiveram os impactos da Medida Provisória (MP) 1.136/2022 no financiamento da ciência, classificados por Helena Nader como “obstáculos” interpostos pelo governo. Ela apontou, através de dados e gráficos sistematizados, “um grande número de ataques sofridos de 2018 até agora”, tendo sido o mais recente a MP 1.136. “Isso mostra direitinho o que se pensa sobre a gente (cientistas). Não satisfeitos com a Emenda Constitucional 95, que é a Lei do Teto dos Gastos, o que se fez? O Ministério da Economia lançou essa MP, que bloqueou tudo: ‘o que você gastou, gastou. O resto existe mais, eu não te libero’. Então, tudo o que vai ser feito via edital, quero saber como vai ser pago”, criticou a pesquisadora.

Helena Nader, que também é professora titular da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), prevê um 2023 ainda pior para a ciência. “Porque está contingenciado um percentual que vai diminuindo ao longo dos anos. É um golpe. O Congresso Nacional votou isso (MP 1.136) e agora uma canetada leva embora os recursos”, lamentou. A ABC e outras entidades científicas, no entanto, acompanham de perto uma ação de inconstitucionalidade já movida por quatro partidos, de acordo com a docente – para quem a MP 1.136 “vai na contramão do desenvolvimento”.


“Se a Constituição fosse cumprida, seria perfeita”

Durante sua conferência, Helena Nader também enfatizou os deveres e obrigações do estado brasileiro com a ciência, previstos na Constituição de 1988 e reforçados com a Emenda Constitucional nº 85, de 2015 e outras leis e decretos de 2016 e 2018. “O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa, a capacitação científica e tecnológica e a inovação; a pesquisa científica básica e tecnológica receberá tratamento prioritário do Estado, tendo em vista o bem público e o progresso da ciência, tecnologia e inovação”, citou a presidente da ABC, em referência ao Art. 218 do Capítulo IV da Constituição.

Ela também lembrou a lei 13.243, de 2016, que dispõe sobre estímulos ao desenvolvimento científico, à pesquisa, à capacitação científica e tecnológica e à inovação. Na avaliação de Helena Nader, “a Constituição está sendo rasgada de forma sistemática” e “falta ao Brasil prezar sua história”. Ela recomendou, ainda, que “todos leiam a Constituição de vez em quando” e destacou ter orgulho do documento. “Se fosse cumprida, seria perfeita”, lamentou Helena Nader – que assumiu, em maio último, a presidência da centenária ABC para o triênio 2022-2025, tendo sido a primeira mulher a ocupar esse cargo.


“Ciência e educação não são gastos, mas investimentos!”

A conferência “Educação e Ciência: pilares para soberania e independência de uma nação” também fez um passeio histórico pela criação de algumas instituições e realizações estruturantes do sistema de tecnologia e inovação brasileiros. “Nossa história é muito curta. Quem fala mal da ciência brasileira não conhece nossa história”, enfatizou Helena Nader que ainda rememorou o período da ditadura civil e militar no Brasil. “Tive sorte de não ser torturada, mas tive colegas e professores que foram presos e torturados”.

Helena Nader defendeu o que se entende por “sociedade do conhecimento” – econômica e culturalmente caracterizada por alto grau de dependência de potenciais para criar conhecimento científico e tecnológico. “Ela gera, compartilha e disponibiliza a todos os membros da sociedade conhecimentos que podem ser usados para melhorar a condição humana”, destacou, apontando, ainda, os quatro pilares em que se baseia essa sociedade: liberdade de expressão; acesso universal à informação e ao conhecimento; respeito pela diversidade cultural e linguística; e educação de qualidade para todos.

Argumentando com elementos trazidos de estudos recentes de entidades nacionais e internacionais, além da própria ABC, Helena Nader se posicionou com veemência, por diversas vezes, na defesa das universidades públicas, da ciência, da pesquisa e da educação como um todo. No contexto da pandemia de Covid-19, por exemplo, a conferencista destacou que muitos países aumentaram o orçamento de educação em resposta a ela:: “Ciência e educação não são gastos, mas investimentos! Quem deu rapidamente resposta à pandemia foi a universidade pública. Temos que bater  no peito e dizer: nós fizemos!”.

A própria pesquisadora, durante a pandemia de Covid-19, liderou um estudo que revelou que o heparam sulfato, composto químico similar à heparina, pode reduzir em 70% a entrada do coronavírus nas células. “Eu brigo por políticas de educação”, afirmou Helena Nader, acrescentando ter esperança: “temos a obrigação de deixar claro porque se precisa de ciência e reverter o quadro de fake news e discursos anticiência”.

Aos 74 anos, Helena Nader é a primeira mulher a ocupar a presidência da ABC, ao longo dos 106 anos de história da entidade


Igualdade de gênero: Brasil ocupa 94º no ranking mundial

Desde o início da carreira, a pesquisadora destacou-se pelo posicionamento ativo em defesa da ciência, tecnologia, inovação e educação brasileiras. A igualdade de gênero, a pluralidade na ciência e a educação de qualidade também são pautas prioritárias para Helena Nader, que é membro da Academia de Ciências do Estado de São Paulo (Aciesp), da Academia Mundial de Ciências (TWAS, na sigla em inglês) e da Academia Latinoamericana de Ciências (ACAL).

A conferência ministrada pela presidente da ABC também trouxe reflexões sobre a igualdade de gênero no Brasil, país que ocupa a 94ª posição no ranking mundial – segundo o Global Gender Report (2022), do Fórum Mundial de Economia. Além da ciência, os números nesse sentido ainda não são animadores. Helena trouxe dados sobre mulheres no parlamento e câmaras estaduais brasileiras, bem como em ministérios: “Ao longo das últimas décadas, a presença feminina nas pastas presidenciais quase não evoluiu”, apontou, acrescentando que, nas secretarias estaduais, nos 27 estados do país, as mulheres ocupam cerca de 22% do primeiro escalão.

Já a presença de mulheres nos principais cargos de gestão das maiores empresas do Brasil vem crescendo, de acordo com ela, “mas esse crescimento é lento e a participação ainda é baixa”. De acordo com uma análise realizada pela agência de governança corporativa BR Rating, apenas 3,5% das empresas brasileiras têm CEOs mulheres, destacou em sua apresentação.

O presidente da ADUFC-Sindicato e também integrante do GT Ciência, Tecnologia e Meio Ambiente da entidade, Prof. Bruno Rocha, agradeceu Helena Nader por sua vinda a Fortaleza a convite do GT e acrescentou: “que tenhamos outras oportunidades desenhando juntos a ciência e a tecnologia”. Ele reforçou que as temáticas trazidas pela presidente da ABC têm sido bastante discutidas no grupo, como os efeitos dos cortes na ciência e tecnologia e os impactos que isso tem no desenvolvimento da pesquisa brasileira e do próprio desenvolvimento do país.

Ao fim de sua conferência, diante de uma plateia majoritariamente formada por professores/pesquisadores da UFC, Helena Nader afirmou, ainda, ter sido “uma honra e uma obrigação” participar do encontro a pedido de docentes da UFC e do sindicato de todas as universidades federais. “Eu não poderia me eximir de trazer alguns dados, principalmente pensando num Grupo de Trabalho voltado a essa temática.

(*) Os dados apresentados pela presidente da ABC na conferência “Educação e Ciência: pilares para soberania e independência de uma nação” estão disponíveis em PDF no site da ADUFC.

(**) A conferência de Helena Nader em Fortaleza, no dia 12 de setembro de 2022, está disponível na íntegra no canal da ADUFC no YouTube.



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