O Prof. Marcio Pochmann, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) ministrou, nesta segunda-feira (22/8), a conferência “Transformações sociais, digitalização e impactos no mundo do trabalho”. Professores/as, servidores/as técnico-administrativos/as e estudantes das universidades federais do Ceará (UFC, UFCA e UNILAB) lotaram o Auditório Izaíra Silvino, na sede da ADUFC em Fortaleza, para acompanhar a discussão – também transmitida remotamente no Auditório da ADUFC-Cariri, em Juazeiro do Norte. “Momentos como esses são fundamentais para oxigenar e manter viva nossa esperança. Que possamos, em algum momento e o mais breve possível, recuperar aqui o que nossa educação já foi. Nossa educação está na UTI”, afirmou o conferencista.
A atividade abriu as discussões da “Semana da Educação pela Democracia: em defesa da universidade e da carreira docente”, promovida pela ADUFC-Sindicato. Um momento de paralisações e mobilizações para denunciar cortes sistemáticos na educação, ciência e tecnologia, e dialogar com a sociedade em defesa da universidade pública. Mesmo diante das intensas tentativas do interventor da UFC para impedir a realização do evento, negando espaços para atividades, pressionando e desautorizando diretores/as de unidades acadêmicas, as ações seguem até a próxima sexta-feira (26/8).
Marcio Pochmann é ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA – 2007-2012) e da Fundação Perseu Abramo (2012-2020) e ex-secretário municipal em São Paulo. Atualmente, também é professor colaborador voluntário no Instituto de Economia da Unicamp. Autor de dezenas de livros sobre economia, desenvolvimento e políticas públicas foi agraciado com o Prêmio Jabuti em 2002. Economia Social e do Trabalho são suas principais áreas de atuação.
O docente defendeu, na conferência de ontem, uma educação “muito mais qualificada” para os desafios que o Brasil e o mundo passam a viver neste momento de mudança de época que nossas gerações estão vivendo”. Antes, o Prof. Bruno Rocha, presidente da ADUFC-Sindicato, agradeceu a participação de todos/as e reiterou que a Semana vem sendo pensada e construída há muito tempo e de forma coletiva.. “É um evento que muito nos orgulha, construído em várias assembleias. É através delas que esse sindicato realiza e organiza suas ações”, destacou, lembrando que atividades estão ocorrendo na comunidade acadêmica das três universidades federais do estado.
O olhar pra frente: “Resistir e também avançar”
Mediadora da conferência e secretária geral da ADUFC, a Profª Helena Martins avaliou a realização da atividade com Marcio Pochmann como um “ótimo começo”, fazendo um paralelo com a linha de atuação da atual gestão da ADUFC. “Porque desde o debate do nome dessa nova gestão, já constituída num contexto de bolsonarismo, a gente pensou em ‘Resistir e Avançar’. Nossa discussão sempre foi a de que, sim, nós temos de fazer as resistências, sermos entraves para todo esse processo de desmonte, mas a gente tem também de elaborar, pensar, discutir, reivindicar um outro projeto de sociedade”, explicou.
A docente reforçou os elementos apontados pelo convidado como “ótimos caminhos” de reflexão, enfatizando, ainda, a produção coletiva de pesquisas, de discussões e de mobilizações. Marcio Pochmann citou, em algumas de suas falas, a necessidade de um “planejamento de onde queremos chegar”, do olhar pra frente. “Resistir e também avançar”, apontou.
- Algumas reflexões do Prof. Marcio Pochmann durante a conferência:
Pensar o futuro
“Estamos submetidos a uma discussão rasa (na educação). Viramos uma espécie de pronto-socorro. Mas a saúde não pode viver só do pronto-socorro. Para um país que não trata do futuro, qualquer vento serve. Porque o vento serve às emergências. Nós das universidades, precisamos fazer. Vivemos numa sociedade de classes, onde a classe operária planeja o mês; nós, da classe média, pensamos o planejamento do ano. Mas as instituições democráticas – sindicatos, partidos e demais entidades têm o dever de pensar o futuro. Nós, do campo progressista, temos de pensar, porque hoje não se discute o futuro. E a oferta que nós temos do futuro é algo que nos indica pior do que hoje.”
O medo de ousar
“A gente precisa ousar. Qual é o nosso problema hoje? É o medo. Nós temos medo de fazer diferente. Nós temos medo de ousar. E o medo nos engessa a continuar fazendo o que anteriormente já se fazia. Penso, sinceramente, que esse tipo de ação aqui, de pensar, é uma das maneiras que temos para abandonar o medo. E, abandonando o medo, nós vamos mais longe. Estamos mais preparados, qualificados. Podemos ir mais longe. Essa semana é muito importante na vida da universidade. É um espaço, infelizmente, privilegiado no Brasil e a gente precisa fazer dele o melhor possível. É importantíssimo ocuparmos nossos espaços. A universidade não pode abandonar a mão. Não pode baixar a cabeça. Porque ela é, de fato, um dos elementos do protagonismo da mudança que a gente espera no Brasil como a nova maioria política.”
Organizar para mudar
“Estamos vivendo um momento-chave. Os que nos dominam sabem que, nesses momentos, sua capacidade de dominação é mais fragilizada. Porque é uma transição, é uma mudança de época. É nesse momento que nós mais temos a capacidade de fazer a história com as nossas mãos. E ao estarmos diante da ideia de que ‘há um cancelamento futuro, não tem o que fazer, vamos cuidar da emergência’, isso vai desmobilizando. Porque um povo triste não luta pelo seu futuro. Luta por seu cotidiano. E esse é um papel importantíssimo nosso. As ideias que trazemos e discutimos não vão mudar a realidade. Quem muda a realidade somos nós, organizados, de forma consciente.”
Dominação frágil
“A classe dominante desistiu do país. Jogaram fora o que nós tínhamos. Por isso que eles também são frágeis e sabem disso. Mas não podemos cair na conversa deles. Senão, ficamos basicamente circunscritos aos limites das emergências. Sem poder oferecer alguma coisa que vá além.”
“Insatisfação generalizada”
“Sinto que o Brasil vive um momento de pré-insurgência. Uma grande parte da população não está satisfeita. Há uma insatisfação generalizada. E a insatisfação é um passo fundamental para mudar. Nossa dificuldade é que ainda ainda não encontramos uma maneira de tornar a insatisfação individual e a insatisfação coletiva em torno de algo que nos una. Porque o que acontece é uma fragmentação de visões. Quando cada um de nós tem o seu projeto, o seu plano, nós não temos nenhum. Como construir algo que, na verdade, unifique? Esse é o desafio que nós temos hoje”.
(*) Assista à conferência do Prof. Marcio Pochmann no canal da ADUFC no YouTube
(**) Confira a programação completa da “Semana da Educação pela Democracia: em defesa da universidade e da carreira docente”