O exemplo da Universidade Federal do Ceará (UFC), uma das primeiras Instituições Federais de Ensino (IFEs) a sofrerem processo de intervenção no governo de Jair Bolsonaro, foi um dos destaques nas discussões do 40º Congresso do ANDES-Sindicato Nacional, realizado em Porto Alegre-RS, entre os dias 27/3 e 1º/4. A ADUFC-Sindicato, que participou como delegação convidada do evento, integrou todas as discussões que levaram à deliberação, durante o Congresso, pela realização de uma campanha nacional contra as intervenções IFEs. Os/as docentes também votaram pela revogação imediata de todas as nomeações de reitores não eleitos pela comunidade acadêmica.
No quinto dia de evento, o presidente da ADUFC, Prof. Bruno Rocha, participou de uma cobertura especial sobre o tema, transmitida diretamente do auditório Araújo Vianna, onde foram realizadas as plenárias gerais. “Entendemos que essa intervenção tem de ser combatida e o combate passa também por revisarmos a legislação que conduz o processo de realização das consultas, tornando-as processos eleitorais. Que se extinga a lista tríplice e que se possa levar ao aumento da democracia e da autonomia universitárias”, defendeu o docente, em entrevista. O programa, produzido pela Associação dos Docentes da Universidade Federal Fluminense – Seção Sindical do Andes-SN (ADUFF-SSind), trouxe relatos de experiências da luta contra as intervenções em várias instituições.
A exemplo dos demais representantes de entidades sindicais que enfrentam situação semelhante, Bruno Rocha contextualizou o processo de intervenção na UFC, iniciado em agosto de 2019 e classificado por ele como “difícil e conturbado”. O docente reforçou a atuação sindical da ADUFC nesse sentido, e que tem garantido muitas conquistas e proteções aos professores, “principalmente no que diz respeito às perseguições implementadas pelo regime e pela forma de condução autoritária que as reitorias em intervenção acabam impondo à comunidade universitária”.
O presidente do sindicato relembrou, ainda, as várias batalhas judiciais com a reitoria, inclusive no que dizem respeito à própria perseguição a professores, técnico-administrativos e discentes, “o que tem sido uma constante”. Vários deles foram encerrados, destacou o Prof. Bruno, “na perspectiva de que eram processos persecutórios e que traziam aí o componente do assédio bem caracterizado”. Segundo ele, a intervenção vai além da perseguição direta a técnicos, estudantes e professores. “Ela passa pelo processo de desarticulação da democracia dentro da universidade, de esvaziamento dos conselhos universitários, e traz também decisões extremamente danosas a toda a comunidade universitária”, denunciou.
Problemas no retorno presencial: outro ponto em comum das intervenções
O presidente da ADUFPB, Prof. Fernando Cunha, também trouxe relatos da intervenção do governo Bolsonaro na Universidade Federal da Paraíba (UFPB), e que teve início em dezembro de 2020. “Um candidato que participou da consulta eleitoral e não obteve nenhum voto no colégio eleitoral foi indicado na lista tríplice e mesmo assim foi nomeado como reitor”, disse, em referência ao interventor Valdiney Gouveia. Desde essa época, explicou o docente, a comunidade acadêmica permanece na luta pela nomeação da reitora eleita, Profª. Terezinha Domiciano, e da vice-reitora, Profª. Mônica Nóbrega, eleitas após ampla consulta na instituição: “e continuamos na luta, aguardando inclusive decisão judicial, para garantir que elas tomem posse”.
Em sua fala, o presidente da ADUFPB trouxe elementos idênticos ao processo de intervenção atravessado na UFC: “Nesse meio tempo, estamos assistindo a uma gestão que vem tentando cercear a liberdade de expressão do sindicato, uma intervenção que não cumpre o que os conselhos superiores da universidade tomou como deliberações. Uma intervenção negacionista, que apostou em não organizar a instituição para o retorno presencial e que chegou a o sinalizar no auge da pandemia”.
Também participou do programa a Profª. Elisabete Búrigo, diretora do ANDES/UFRGS e para quem a realização do Congresso do Sindicato Nacional em Porto Alegre foi “um reforço à luta contra a intervenção de Bolsonaro” na Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Ela lembrou que a intervenção na UFRGS teve início em setembro de 2020, tendo a comunidade universitária resistido desde o início: “estudantes, técnicos e docentes; estamos mobilizados todo o tempo”. Uma das pautas, de acordo com a dirigente, é a privatização da universidade. “Uma privatização que não aconteceu via Future-se e que está sendo implementada, etapa atrás de etapa, pelo reitor interventor, Carlos Bulhões, com o consentimento da vice- interventora, Patrícia Franco”.
A exemplo dos aspectos das intervenções no retorno presencial em universidades como UFC e UFPB, a UFRGS traz os mesmos elementos de descaso. “A gente está lutando para ter condições sanitárias para o retorno presencial, inclusive porque o descaso da reitoria interventora com a qualidade do ensino não tem limites. A reitoria não está providenciando nenhuma condição pelo retorno presencial”, denunciou Elisabeth Búrigo.
(*) Assista à cobertura sobre intervenções nas IFEs no canal da ADUFF-SSind no YouTube (a partir do tempo 37’)
(**) Veja o vídeo da fala do presidente da ADUFC no mesmo programa, com interpretação para Libras