Em Assembleia Geral da ADUFC na noite da última terça-feira (18/1), docentes aprovaram, por unanimidade, o fortalecimento e a adesão do sindicato à mobilização nacional em torno da campanha salarial dos/as servidores/as públicos/as federais. A decisão ocorre em um contexto de defasagem salarial causada pela não reposição integral do reajuste inflacionário acumulado em quase 39% desde 2015. Isso levou à desvalorização de até 20% nos salários de professores e professoras das universidades federais, conforme levantamento apresentado na ocasião. Mais de 100 professores/as filiados/as participaram da AG.
Docentes deliberaram uma série de ações para os próximos meses visando aquecer essas mobilizações, como a continuidade das visitas da ADUFC aos departamentos das universidades para pautar o tema; agendamento de nova AG, após o término dessas visitas, para debater o indicativo de greve com os elementos sobre o índice de reajuste e cenário de mobilização do ANDES-SN e do Fonasefe (Fórum das Entidades Nacionais dos Servidores Públicos Federais); e campanha de comunicação relacionada à campanha salarial reforçando a imagem do servidor público de forma positiva junto à sociedade. A ADUFC participa de uma série de articulações sindicais que estão discutindo o tema e buscando uma mobilização unitária.
Precedendo o debate, o Prof. Alfredo Pessoa, do Departamento de Teoria Econômica da UFC, fez uma explanação sobre a crise econômica instalada no Brasil nos últimos anos, contextualizando como o avanço do neoliberalismo está relacionado ao ataque do Estado brasileiro juntamente com o desmonte dos direitos trabalhistas. “Esse retorno neoliberal configurou uma retirada de direitos (…). O salário mínimo já não valoriza acima da inflação, por exemplo”, destaca.
Alfredo Pessoa diz que esse cenário de corte de gastos públicos é alimentado por um discurso governista (com apoio do mercado financeiro) de que o serviço público é um ônus para o país. “Outra percepção do governo é de que os salários aumentaram muito, o que não é verdade, houve apenas a atualização da inflação. O gasto com servidor público está congelado, isso é só reposição”, ressalta, apontando que a relação servidores públicos/taxa populacional é menor no Brasil do que em países como Japão, Alemanha e Estados Unidos.
O presidente da ADUFC, Prof. Bruno Rocha, avalia que essa mobilização surge a partir da reorganização da luta dos servidores públicos iniciada com a jornada contra a PEC 32, no ano passado, quando servidores de todo o país ocuparam Brasília por meses para barrar a reforma proposta pelo governo desmontando o serviço público. “A luta contra a reforma administrativa mostrou que pode haver uma disposição para a campanha salarial”, reforçou o docente, acrescentando aspectos que podem ser favoráveis à negociação, como o enfraquecimento do governo federal em meio a um ano eleitoral.
O presidente da ADUFC apresentou um levantamento realizado pelo Prof. Júlio Barros, do Departamento de Estatística e Matemática Aplicada da UFC, com o comparativo de gráficos relativos às perdas salariais dos docentes no intervalo de dezembro de 2015 a janeiro de 2022. Estão incluídos nessa lista professores associados, adjuntos, assistentes e auxiliares, e há variações entre as classes, mas em algumas delas a desvalorização salarial ultrapassa 20% nos últimos seis anos. Se for considerado como base o ano de 2012, o valor das perdas pode chegar a 40%.
Bruno Rocha também afirmou que a pauta da campanha salarial não emergiu antes porque os últimos anos foram de enfrentamento incessante às diversas tentativas de rebaixamento salarial orquestradas pelo governo federal. “Por três vezes, o governo Bolsonaro tentou reduzir nossos salários – na época da aprovação do auxílio emergencial, no início da pandemia, e no final de 2020, com a PEC Emergencial (tentava-se, mais uma vez, retirar 25% dos nossos salários)”, destacou. “Depois veio a PEC 32, em que, durante todo o ano passado, o governo tentou aprovar essa pauta”, acrescentou.
Docentes defendem avanço da luta e campanhas de valorização do serviço público
Durante o debate, diversos professores/as compartilharam suas opiniões a respeito da viabilidade de uma campanha para reposição salarial, ponderando também sobre as dificuldades do avanço da pauta em um contexto pandêmico e em meio ao agravamento de uma crise econômica que massacra as classes populares. Muitas das explanações, entretanto, convergiram para a necessidade de enfrentar a pauta, uma vez que não há garantias de que no próximo ano haverá um cenário mais propício para debater o tema.
“O sentimento do cansaço atravessa a todos, mas temos que focar em algo que a gente consiga se mobilizar coletivamente. Temos como exemplo a vitória da PEC 32, que não foi pequena. Isso (barrar a reforma administrativa) concretamente significa que a gente ainda continua tendo Estado”, ressalta a secretária-geral da ADUFC, Profª. Helena Martins. “Temos um desafio enorme, mas contamos com o contexto de um governo muito enfraquecido e de muitas pessoas insatisfeitas. Precisamos fazer crescer esse sentimento de que não pagaremos pela crise e construir alianças com outros setores”, complementa.
Muitos docentes também reforçaram a importância de fortalecer um discurso de valorização do serviço público e das universidades públicas. A ideia é aprofundar o diálogo com a sociedade, já iniciado por entidades como ADUFC e ANDES-SN nos últimos anos, para desconstruir o discurso, implantado pelo governo federal e por setores neoliberais, que culpabiliza servidores públicos pela crise econômica e minimiza o trabalho desses trabalhadores.
“Na universidade, estamos passando apertos, mas em nenhum momento nós paramos. Nenhum de nós perdeu o semestre, muitos de nós aprendemos a manusear todo aquele mundo virtual que não era o nosso (com as aulas remotas), os que atuavam nos laboratórios continuaram trabalhando, mesmo na pandemia”, disse a Profª. Sâmia Brilhante, da Faculdade de Medicina da UFC, citando contribuições efetivas da universidade para a sociedade, inclusive durante a pandemia. “Haverá reclamações, mas cabe a nós, servidores públicos, nos juntarmos a essa luta”, defendeu.
No início da AG, o presidente da ADUFC, Prof. Bruno Rocha, deu um informe sobre os encaminhamentos do ANDES-SN a respeito da campanha salarial. O Sindicato Nacional definiu o período de 17 de janeiro a 11 de fevereiro para que as seções sindicais deliberem nos estados sobre a construção de greve unificada do setor público federal com a pauta da reposição salarial (índice definido no Fonasefe). A pauta de demandas inclui, ainda, melhoria nas condições de trabalho e revogação da Emenda Constitucional 95 (a PEC da Morte), que congela gastos públicos, incluindo saúde e educação.
(*) Acesse as tabelas com o levantamento das perdas salariais docentes nos últimos anos