A ADUFC encerrou nesta sexta-feira (15/10) a Semana do Professor e da Professora com o saldo positivo de acúmulos e intensas trocas e partilhas de conhecimentos sobre os ensinamentos e a atualidade de Paulo Freire, tema do evento. Reflexões sobre a dialogicidade do reconhecido pensador da Educação, espaços artístico-culturais, rodas de conversa sobre a construção de uma universidade democrática, lutas do movimento docente no governo Bolsonaro, lançamentos de livros: essas foram algumas das atividades ao longo desta semana, pensadas e construídas coletivamente e transmitidas em tempo real pelo canal da ADUFC-Sindicato no YouTube.
“Essa semana foi organizada com trabalho muito coletivo do GT de Comunicação e Cultura e a Diretoria da ADUFC. Mesas, oficinas, debates, sempre priorizando o pensamento do Paulo Freire, e foi feito por muito carinho por vários professores, por isso também foi tão bonito” ressaltou o Prof. Tiago Coutinho, durante a abertura do evento. Diretor de Atividades Científicas e Culturais da ADUFC e um dos organizadores da Semana, que teve início na segunda-feira, 11 de outubro, o docente manifestou ter “orgulho demais de um sindicato que está produzindo cultura”. Todas as atividades foram abertas ao público e realizadas de forma remota, ainda devido às medidas de segurança sanitária ao enfrentamento da pandemia de Covid-19.
Uma das mesas de debate abordou, na terça-feira (12/10), a “Dialogicidade freireana e contributo para um novo tempo” ao propor uma reflexão sobre a Teoria da Ação Dialógica de Paulo Freire. “Ele foi muito inovador, e eu diria até revolucionário, para a época que escreveu sobre o diálogo na educação quando se tinha uma estrutura didática de ensino em que os docentes estavam completamente hierarquizados em relação aos educandos”, destacou uma das debatedoras, a Profª. Sandra Gadelha, do Curso de Pedagogia da FAFIDAM/UECE e do Mestrado Acadêmico Intercampi em Educação e Ensino (MAIE/UECE).
No mesmo dia, uma roda de conversa trouxe para debate o tema “Paulo Freire e a universidade que queremos: diversidade de sujeitos e saberes”, reconhecendo a importância das lutas populares na transformação das universidades. “Como podemos fortalecer a participação desses vários sujeitos (na universidade) e, por meio dessa participação, a luta por uma educação emancipadora?”, questionou a Profª. Helena Martins, secretária-geral da ADUFC e uma das organizadoras do evento.
Na quinta-feira (14/10), a Semana do Professor e da Professora da ADUFC apresentou a mesa de debate “Docentes em Movimento: nossas batalhas contra o governo Bolsonaro”, que pautou os ataques do atual governo federal ao serviço público, em especial à educação, o que tem interferido no cotidiano das professoras e dos professores. No debate, o Prof. Bruno Rocha, presidente da ADUFC-Sindicato, expôs as principais lutas do movimento docente nos últimos anos e atualizou a situação da PEC 32, que tramita na Câmara Federal e aguarda votação em plenário.
“Nós vamos derrubar essa PEC. O governo não vai conseguir os 38 votos, o Arthur Lira (presidente da Câmara Federal) não vai conseguir os 308 votos que ele precisa. Nós estivemos nas últimas quatro semanas ininterruptamente em Brasília”, ressaltou o docente, que tem participado dessa Jornada de Lutas contra a PEC 32. Segundo ele, essa mobilização contra a reforma administrativa representa “uma união há muito tempo não vista das entidades sindicais representativas para derrotar o que talvez represente a maior destruição dos serviços públicos e o maior retrocesso do marco civilizatório que foi o estabelecimento das regras para o bom funcionamento do serviço público”.
Sobre amizade e resistência: evento lança livros e reforça afetos
O lançamento de dois livros também emocionou e foi destaque na programação da semana. Já na segunda-feira (11/10), “Cenários da Libertação: Paulo Freire na prisão, no exílio e na universidade” abriu o evento. O livro foi escrito por Clodomir Santos de Morais e reeditado recentemente pela Editora Expressão Popular, com apoio da ADUFC. Os pernambucanos Clodomir de Morais e Paulo Freire eram amigos de longa data, estiveram encarcerados juntos durante o período da ditadura civil e militar no Brasil e lutavam por causas semelhantes.
“Sinto-me muito honrado em ter essa oportunidade, também porque essa diretoria (da ADUFC) me representa demais e tem feito por nós um trabalho político fundamental”, disse o Prof. João Figueiredo, durante o lançamento do livro, prefaciado por ele. Especialista do pensamento freiriano e professor da FACED/UFC, destacou a “escolha acertada” do sindicato em oferecer o livro como presente de Dia do Professor e da Professora. Em sua fala, ele destacou os três cenários “com lições inovadoras” apresentados por Clodomir em sua obra: prisão, exílio e universidade. “Clodomir também nos traz, em seu livro, um retrato do primeiro instante da ditadura militar que a gente não encontra em lugar nenhum”, acrescentou Figueiredo.
O segundo livro lançado na Semana Paulo Freire Hoje abrilhantou a programação cultural da quinta-feira (15/10). E também emocionou. “Memórias de Quarentena” foi lançado em formato e-book para a Semana e teve um lançamento em formato híbrido, com a presença das organizadoras – professoras Alba Pinho (UFC), Ângela Pinheiro (UFC) e Camila Holanda (UECE) – na sede da ADUFC em Fortaleza e transmissão em tempo real, como o restante da programação. A obra, segundo as organizadoras, nasceu coletiva e com um único objetivo: partilhar a vida em textos, num momento de medos, inseguranças e instabilidades. A iniciativa foi tomando formas, reunindo relatos de pessoas com inserções, emoções e realidades diversas. Ganhou amplitude virou um registro em e-book de experiências vividas na pandemia de Covid-19 e narradas através de 74 textos.
“Queria destacar o empenho e a sensibilidade que essas professoras tiveram na organização do livro e prestar, junto com elas, nossa solidariedade às famílias e amigos dos mais de 600 mil brasileiros e brasileiras mortos em decorrência da Covid-19”, enfatizou a vice-presidente da ADUFC, Irenísia Oliveira. A docente, que participou do lançamento diretamente da sede do sindicato e também está entre os/as autores/as da coletânea. “São memórias que resgatam aquilo que tem de mais sensível, de mais solidário e que nos torna propriamente humanos. Foi uma honra”, acrescentou Irenísia.
Referindo-se à docência como “uma prática amorosa”, a Profª Camila Holanda lembrou estarmos “sobrevivendo, mas uma sobrevivência despedaçada”. Ela disse enxergar também a produção do livro como “uma forma de estarmos juntos e juntas” e reafirmou o dia do lançamento como tempo de alegria: “Ela sempre será nossa maior resistência”.
Já Profª. Ângela Pinheiro destacou os “gestos de empatia e solidariedade que começaram a brotar, florescer, a nos conclamar à vida” quando começaram a costurar os afetos para a organização dos textos. “As demonstrações de medo, solidão, tristeza, saudade, se preponderantes não esgotam o que se passava em nós e entre nós”, sugeriu a educadora, acrescentando que a empatia e solidariedade entre pessoas, grupos, instituições e movimentos alimentaram o “esperançar” a que se referia Paulo Freire e a “alimentar a resistência e a luta”.
A Profª. Alba Pinho reforçou que o “Memórias de Quarentena” foi uma ideia que nasceu coletivamente, “sem maiores pretensões, num tempo muito difícil para a humanidade e especialmente para o Brasil, que vive dupla pandemia: coronavírus e bolsonarismo”. A docente lembrou que as três organizadoras estiveram, desde março de 2020, quando oficialmente a pandemia chegou ao Brasil, “impactadas, como todo o mundo”. Foi quando resolveram partilhar as vivências e percepções “desse tempo que nos tomou de assalto e adentrou em nossas vidas, revolucionando economia, política, e forma de viver e conviver”.
Programação cultural e o passeio por Freire
As apresentações artísticas e culturais também tiveram destaque na Semana do Professor e da Professora da ADUFC. Logo na abertura do evento, o público assistiu ao espetáculo “De sons a saberes: Paulo Freire e Izaíra Silvino, uma homenagem do Grupo 30 Cordas”, que celebrou as vidas de dois mestres da Educação. Os músicos declamaram citações de Freire e da Profª Izaíra Silvino, que faleceu em agosto deste ano, em uma apurada apresentação instrumental que mesclou clássicos das sonoridades populares e da música ocidental.
Na noite de quinta-feira (14/10), a Banda Sol na Macambira apresentou o show “O Trovador do Tempo”. “Essa programação cultural não é meramente ilustrativa, todo o pensamento de Paulo Freire está permeado nela”, ressaltou o Prof. Tiago Coutinho ao anunciar o grupo, que se apresentou diretamente do Cariri, o mesmo cenário que é retratado em sua obra musical. O docente lembrou que os músicos também foram escolhidos pela relação com a região e a cultura popular e os movimentos sociais, além de serem educadores populares com grande inspiração em Paulo Freire.
Com o tema “Paulo Freire Hoje: educação para a liberdade”, a Semana do Professor e da Professora da ADUFC encerrou sua programação nesta sexta-feira à noite (15) com a exibição da peça teatral “Napoleão”, do Grupo Pavilhão da Magnólia. O texto e a direção são de Marcelo Romagnoli (SP), e o espetáculo narrou a história de um menino tímido que tinha o sonho de cantar. A peça aborda a infância contemporânea e os desafios que ela traz à família e à educação. Toda a programação cultural, incluindo o trabalho dos artistas envolvidos, foi cuidadosamente costurada em sintonia com o legado de Freire, que tanto prezou por libertação, democracia e diversidades.