O uso da PEC Emergencial para desvincular recursos da saúde e educação pelo governo federal pautou boa parte do programa Democracia no Ar da última segunda-feira (1º/3). Veiculado pela Rádio Atitude Popular e emissoras parceiras, o debate teve como convidado o primeiro-tesoureiro da ADUFC-Sindicato, Prof. André Ferreira, do Departamento de Teoria Econômica da Universidade Federal do Ceará (UFC). Apresentado pela jornalista Marina Valente, o programa também teve a participação, como comentarista, da Profª Sandra Helena Souza, da Universidade de Fortaleza (Unifor).
O debate ampliou o espaço para discutir os ataques ao serviço público e a servidores e servidoras, a exemplo de duas propostas de emenda à Constituição que tramitam no Congresso Nacional: a PEC Administrativa e a PEC da Reforma Administrativa. Sob o argumento de ajuste fiscal das contas de municípios, estados e União, o Governo Federal, com apoio de parte do Congresso, avança contra servidores/as públicos, ameaçando serviços essenciais prestados à sociedade, como saúde e educação.
Classificando o impacto da PEC 186/2019 (Emergencial) como “devastador”, André Ferreira lembrou que, do ponto de vista social, os brasileiros já vivem em um país extremamente desigual. “E essa questão social é mais aflorada ainda num contexto de pandemia e, mais adiante, de pós-pandemia”, disse. Uma das questões para as quais alertou o professor e economista foi a devastação ambiental promovida e incentivada pelo próprio ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, aproveitando o contexto de pandemia e “a desorganização da vida das pessoas nesse momento”. A expectativa, segundo o Prof. André, é que a devastação ambiental sob o comando de Salles aumente ainda mais “e isso possa, inclusive, contribuir para a ocorrência de mais pandemias”, como alguns segmentos da comunidade científica vêm defendendo.
Contexto de pandemia: a importância do serviço público
André Ferreira observou também que, “de maneira muito evidente”, quem de fato vai socorrer a grande massa da população em circunstâncias como essa (de pandemia) é o serviço público: “é ele que vai acolher nos hospitais, nos postos de saúde; é ele que vai desenvolver pesquisas para produzir vacinas – extremamente importantes nesse contexto – e nas diversas outras áreas; e isto já está mais do que comprovado”.
Dentro desse debate, a PEC Emergencial coloca-se “claramente”, de acordo com André Ferreira, na discussão sobre um modelo neoliberal de sociedade. E já seria mais que evidente, ainda segundo o economista, que algumas áreas sociais e, particularmente as áreas da pesquisa e da educação, não têm o mesmo interesse para a iniciativa privada. “E mais de 90% da pesquisa no Brasil, por exemplo, é feita por instituições públicas”, enfatizou. Para o professor, no momento atual, a disputa passa pela apropriação do conhecimento e do desenvolvimento econômico.
A necropolítica do governo Bolsonaro, o desmonte do estado brasileiro e a não menos danosa Reforma Administrativa (PEC 32/2020) também pautaram o programa. O Prof. André pontuou, inclusive, que não se pode desvincular a PEC Emergencial da Reforma Administrativa ou de outras como a PEC do Teto de Gastos, que também atingiu os investimentos sociais. E critica, referindo-se à negação insistente de não se taxar as grandes fortunas: “Se o governo está precisando de dinheiro, por que não se cogita então tirar dos mais ricos? Tirar do sistema financeiro? Dos banqueiros, que estão tendo recorde de lucratividade? Por que não se mexe nisso? Precisamos entender qual a lógica deste modelo, que parte de uma ideia muito difundida de que o estado é mau e a iniciativa privada é boa, quando a própria realidade, incluindo a história dos países desenvolvidos, demonstra a insuficiência desse entendimento”.
(*) O programa Democracia no Ar sobre a PEC Emergencial, com a participação do Prof. André Ferreira, pode ser reouvido na página da Rádio Atitude Popular no Youtube .