Jéssica Araújo, Isabel Sousa e Vanessa Santiago Sousa (Advogadas, Integrantes do Coletivo Artigo 227)
Antes de tudo, quem somos?
Sou Jéssica Araújo, natural de Fortaleza, filha do Sr. Antônio e da Dona Liduína. Cresci no bairro da Parangaba, e, de lá, trago as minhas memórias da infância e experiências vividas. Na adolescência, iniciei minha trajetória nas causas da infância e juventude. Foram muitos momentos marcantes, desde as brincadeiras no meio da rua, passando pelas aulas ministradas no projeto da igreja e o “reforço escolar” para algumas crianças do bairro. Levo comigo muitas alegrias, histórias e lições aprendidas com muitas pessoas que atravessaram minha caminhada.
Sou Isabel Sousa, paraibana de nascença, cearense de coração, e apaixonada pela natureza. Minha infância tem cheiro de mato, serra e sertão, e gôsto de “cuscuz com ovo e tomate”, feito com todo carinho pela minha vó Hermínia, em Itapajé. Ela foi regada a muitas brincadeiras e encontros em família, especialmente nas calçadas e quintais. Cresci e me constituí como militante de direitos de crianças e adolescentes ao longo dos anos. Aprendi tanto com tanta gente: desde as crianças nos “lixões”, no bairro Pedras em 2006, em Fortaleza, até os adolescentes agredidos nos centros educacionais. Também recebi sorrisos das crianças de tantas famílias, com as quais tive oportunidade de atender e assistir juridicamente.
Sou Vanessa Santiago Sousa, venho do interior do Ceará, da cidade de Russas, no Vale do Rio Jaguaribe. De lá, trago minhas lembranças de infância e meu desejo de contribuir para muitas outras infâncias e adolescências – despertado naquele encontro, realizado em Morada Nova, em que representei as crianças de minha cidade. Chegando aqui, o desafio da cidade grande, superado pelas boas amizades que fui cultivando, e que, até hoje, fazem parte de quem sou! Aqui, encontrei meu amor e projetos de vida! Escolhi abraçar o desejo de criança! Hoje, junto com a Jéssica e a Isabel, faço parte do Coletivo Artigo 227, um reflexo de quem somos, do que pensamos e do que desejamos com/para nossas crianças e adolescentes. E por falar em crianças e adolescentes, a Pandemia potencializou muitas feridas abertas de nossa sociedade: a injustiça social tem impactado, por exemplo, no aumento de violência de todo tipo contra crianças, adolescentes e jovens- física, sexual, moral, psicológica.
Além disso, falta acesso a saneamento básico e a moradias adequadas; sobra evasão escolar, vulnerabilidade à violência armada e extrema pobreza. Isso tornou mais do que evidente o fato de que precisamos fortalecer as famílias nas suas condições materiais e subjetivas para o cuidado com as crianças e adolescentes. Os impactos negativos da gestão da crise atual reverberam de forma mais incisiva na vida e no desenvolvimento integral desse público, sujeito de direitos, em condição peculiar de desenvolvimento, titular de direitos fundamentais previstos na nossa Constituição Federal de 1988 e em diversas leis nacionais, estaduais e municipais, ao qual se deve atribuir prioridade absoluta na previsão e execução de políticas públicas. Como Coletivo Artigo 227, decidimos nos unir aos parceiros do Sistema de Garantia de Direitos (SGD) para pautar o necessário fortalecimento das políticas públicas infanto-juvenis, destacando a importância da efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente (que acabou de completar trinta anos!). Assinamos notas públicas, realizamos e divulgamos formações virtuais, apoiamos campanhas solidárias, estudamos, escrevemos, endossamos a campanha pelo estabelecimento de uma renda básica emergencial para as famílias e contribuímos na promoção e defesa dos direitos das crianças e adolescentes do nosso Estado. Neste período de Pandemia, muitos são os desafios enfrentados, demandas profissionais e pessoais, e, sobretudo, de cuidado, o que demonstrou quão vulneráveis nós somos. Mesmo diante das dificuldades, nos fortalecemos como mulheres, trabalhadoras, militantes de direitos e esperançosas por um mundo mais leve, potente e justo para todos e todas.
Nesta sintonia do Coletivo Artigo 227, construímos nossa história, conquistamos espaços, inovamos e crescemos juntas, auxiliando no imenso bordado dos afetos, tão necessários na vida de todos nós. Foram tantos sentimentos, que precisamos lembrar de pausar e in/ex/respirar com calma. Às vezes, nossas atitudes impactam situações e não temos dimensão de como auxiliamos a tecer a vida do outro, através do que escrevemos e acreditamos. E agora, enquanto a lua cheia insiste em aparecer, findamos estas “memórias” com a lembrança do tema da Conferência Nacional dos Direitos da Criança, em 2012: “Se o mundo é bom para as crianças, o mundo é bom pra todo mundo”.