(pseudônimo de professora de uma faculdade particular em Fortaleza)
Comecei a dar aulas de forma remota – que significa, fora da linguagem informática, o que é distante, distanciado – na semana do dia 23 de março, assim que foi declarada a suspensão das aulas e o isolamento social em virtude da pandemia da Covid-19. Isoladas e distantes também se tornaram as expressões das(os) estudantes, através de seus sorrisos, inquietações, dúvidas, afetações, comentários e/ou incompreensões. Para muitos deles e delas era impossível a ação de ligar o microfone enquanto assistiam aula, pelo chat. No entanto, era possível ler mensagens como: “Professora, aqui em casa é muito barulhento, eu não tenho como participar de forma oral do encontro”. Menos de 50% da turma assistiam as aulas. Em outras somente 30% dos alunos se faziam presentes semanalmente. E o restante? Que possibilidades tinham? Será que viam as aulas em outro momento? Durante os primeiros encontros, a falta de conhecimento na utilização da plataforma fazia com que a ansiedade do grupo impedisse que o momento transcorresse. Eram constantes as interrupções dos estudantes se movimentando, alguns tentando entrar na sala virtual, outros atrasados e outros tantos “saindo” ou “caindo” devido à dificuldade de conexão. O tempo foi passando e de lá para cá, muitas tristezas, angústias e ansiedades, em um cenário de muita precariedade, pois os alunos não dispunham de equipamentos adequados ou suficientes, tampouco de internet com qualidade. Uma parcela considerável só dispunha de smartphones com internet 3G para o acesso as aulas e demais atividades. Outros narravam histórias em que pediram senhas da internet de seus vizinhos para acessarem as aulas. E assim o caos ia sendo formado. Ao final da aula tínhamos estudantes insatisfeitos e professores estressados. A instituição, por sua vez, esperava de nós o preenchimento de vários formulários constando dados percentuais de quem estava presente na aula. Ainda nos foi solicitado ligar para uma lista de 60 estudantes, dos nossos telefones pessoais, buscando saber quais dificuldades estavam ocorrendo na utilização da plataforma. Ora, eu também gostaria de receber essa chamada enquanto professora, afinal não sei desempenhar as funções de técnica de informática e tampouco de telemarketing. Eis que chegou o momento das avaliações e o trabalho estava cada vez mais enfadonho, sem vida e sem potência, com correções de provas-formulários feitas na própria plataforma. Os textos dos estudantes, muitas vezes, eram copiados e colados dos slides e apresentações, sem reflexão, sem senso crítico. E então as avaliações participativas, vislumbrando um contexto de prática politicamente engajada e compromissada já não fazia parte das possibilidades que dispúnhamos. Depois de todos os desafios enfrentados diante de tantas limitações, o fim do semestre se deu com mais desolação e desesperança, pois logo chegaram as demissões dos professores. Grandes amigos de trabalho, mestres e doutores, com longas trajetórias acadêmicas foram dispensados em plena pandemia. E então nos perguntamos qual o rumo da educação superior no país? Um cenário preocupante se constrói diante de nós, com as desigualdades educacionais cada vez mais naturalizadas e ignoradas, com professores fingindo que estão ensinando e estudantes fingindo que estão aprendendo.