Diante da enorme rejeição, interventor abrevia cerimônias para punir estudantes e criminalizar movimentos legítimos.
Ao fim da noite desta sexta-feira (24), após o encerramento da última cerimônia de colação de grau do período letivo 2019.2, em Sobral, serão mais de 1.300 novos graduados pela Universidade Federal do Ceará, espalhados ainda pelos campi de Fortaleza, Quixadá, Russas e Crateús. As cerimônias de colação de grau deste ano foram um marco na vida da universidade porque celebraram o momento especial da graduação dos estudantes, mas também por terem sido espaços de reafirmação da democracia universitária e de expressão da enorme rejeição à intervenção na UFC. Ato de protesto (mosaico) organizado por entidades representativas de professores e estudantes, no primeiro dia, e manifestações espontâneas de formandos em todos os dias da colação, mostram que festa e luta pela democracia se completam.
Confrontado com a enorme rejeição, o interventor resolveu retaliar os formandos, chegando a abreviar em mais de 90% o tempo de duração das cerimônias neste ciclo, que teve início no último dia 14. Além disso, passou a publicar versões falaciosas e ameaças a professores e estudantes, a partir das estruturas de comunicação da própria UFC, com o claro intuito de desinformar a comunidade universitária e a sociedade em geral.
Com as abreviações das cerimônias de colação de grau, o interventor Cândido Albuquerque tinha o objetivo de punir os estudantes que o vaiaram e criminalizar o movimento das entidades representativas de professores e dos próprios estudantes. Os episódios ocorridos em praticamente todas as cerimônias – incluindo vaias e críticas feitas inclusive em discursos de oradores oficiais (no Interior) – explicitam o tamanho da rejeição do interventor entre a comunidade universitária e a resposta autoritária dele a essa rejeição.
Diferentemente da versão que tem sido divulgada de forma insistente pela “Administração Superior”, houve um único ato de protesto organizado por entidades representativas de professores e estudantes. O ato ocorreu no dia 14, perto do fim da cerimônia, depois das falas dos oradores docente e discente, e teve duração de apenas alguns minutos. A manifestação aconteceu de forma vibrante, sendo aderida pela multidão presente na concha acústica, ao fim da qual professores e estudantes saíram aplaudidos. A cerimônia depois caminhou normalmente para o final, entrecortada por vaias ao interventor, como já acontecia desde o início.
A bem da verdade: encurtamento da colação foi determinado pelo interventor
Em retaliação aos estudantes e às entidades representativas, a Reitoria da UFC decidiu abreviar o segundo e o terceiro dias de colação em Fortaleza (15 e 16/1), mesmo antes do início destas e sem qualquer manifestação ter ocorrido. Prova disso é que, no dia 15, ainda nas dependências internas da Reitoria (Salão Nobre), o cerimonial da colação de grau já havia comunicado às autoridades universitárias que o ritual seria abreviado: estariam suprimidos tanto a acolhida dos coordenadores de curso aos representantes discentes quanto os discursos destes e dos próprios docentes. De fato, foi o que ocorreu, para surpresa dos formandos e seus familiares – que não haviam sido previamente comunicados.
Neste mesmo dia (15), cerca de 10 minutos após o encerramento abrupto do evento, outra nota oficial da UFC foi divulgada, com um falso relato prontamente desmentido pelas entidades representativas dos docentes e dos estudantes (Leia aqui as respostas da ADUFC e do DCE, respectivamente). O ato de protesto, relatado pela “Administração Superior” como motivo da abreviação da cerimônia e atribuído a “um pequeno grupo formado por professores e pessoas estranhas à própria comunidade acadêmica”, simplesmente não aconteceu. A referida nota foi mais uma clara tentativa de deslegitimar professores, professoras e o próprio movimento estudantil, diante da sociedade.
O terceiro dia de colação de grau (16) na Concha Acústica deixou novamente explícita essa retaliação: a cerimônia inteira foi mais abreviada ainda, tendo durado pouco mais de cinco minutos quando, a exemplo do que ocorrera na noite anterior durante o discurso do interventor, vaias espontâneas e generalizadas foram ouvidas ao longo de todas as arquibancadas. Nestas, localizava-se a plateia composta por professores, formandos e suas famílias. Reiteramos que esse movimento espontâneo já vinha acontecendo desde o ensaio geral, realizado no dia 9 de janeiro no mesmo local das cerimônias – quando formandos promoviam vaias generalizadas diante do anúncio do momento da fala de Cândido Albuquerque.
Juristas alertam Reitoria e apoiam manifestantes
Diante das ameaças explícitas da Reitoria aos manifestantes, também no dia 15/1 a Associação Brasileira de Juristas pela Democracia – Núcleo Ceará manifestou solidariedade e apoio aos estudantes e professores em “nota de repúdio à tentativa de intimidação por parte da administração superior à livre manifestação de estudantes e professores nas cerimônias de colação de grau da UFC”.
No texto, a ABJD ressaltou que o interesse dos manifestantes na ocasião não era impedir a realização da cerimônia, mas, “em pleno gozo da liberdade de expressão que a própria Universidade deve garantir, manifestar-se contra o exercício do atual reitor nomeado Interventor Federal”. A Associação enfatizou ainda que, ao contrário do que afirmava a Administração Superior, “a manifestação não viola a tradição universitária, mas reafirma a Universidade como local do pensamento crítico por excelência”. A nota também destacou que o livre exercício de protesto ameaçado de responsabilização será objeto de defesa por parte dos Juristas engajados com a democracia.